- S E N T E N Ç A - Vistos etc.
Trata-se de AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL em face de LUCIANO HENRIQUE SORDINE PEREIRA, EVERTON RIBEIRO MORETISSON e MAURÍCIO ALVES DOS SANTOS FILHO, por suposta prática de ato ímprobo previsto nos artigos 9º e 10 da Lei nº 8.429/92.
Em sua peça inicial (fls. 03/48), o autor ministerial sustenta, em síntese, que o requerido MAURÍCIO ALVES DOS SANTOS FILHO, apesar de nomeado para exercer cargo comissionado de “Agente de Gabinete de Representação Parlamentar” no gabinete do requerido LUCIANO HENRIQUE SORDINE PERERIA, então Deputado Estadual, não comparecia à Assembleia Legislativa por incompatibilidade de horário, tendo em vista que também cursava medicina em tempo integral no Centro Universitário do Espírito Santo – UNESC.
Aduz, assim, que além do requerido MAURÍCIO ALVES DOS SANTOS FILHO não ter cumprido integralmente suas obrigações no cargo público que ocupou junto à ALES entre os exercícios de 2009 e 2010, os atestados de frequência firmados pelos requeridos LUCIANO HENRIQUE SORDINE PEREIRA e EVERTON RIBEIRO MORETISSON são “material e ideologicamente falsos” (fl. 05).
Por tais motivos, requer o Ministério Público seja reconhecido o ato de improbidade administrativa especificado nos arts. 9° e 10° da Lei n° 8.429/92, bem como sejam condenados os requeridos solidariamente ao ressarcimento integral do dano material de R$ 10.023,48 (dez mil vinte e três reais e quarenta e oito centavos) e ao cumprimento das sanções civis listadas nos incisos I, II e III do art. 12 da Lei n° 8.429/92. Requer, ainda, sejam os requeridos condenados solidariamente à reparação do dano extrapatrimonial coletivo, no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais).
Por meio da r. decisão proferida às fls. 44/48 foi deferida a tutela de urgência pleiteada pelo parquet.
Manifestação ofertada pelo Estado do Espírito Santo, ratificando os termos da inicial (fls. 64/69).
Devidamente notificados, os requeridos apresentaram manifestação prévia às fls. 125/130 (EVERTON RIBEIRO MORETISSON) e às fls. 158/194 (MAURÍCIO ALVES DOS SANTOS FILHO e LUCIANO HENRIQUE SORDINE PEREIRA).
A r. decisão de fls. 211/236 recebeu a petição inicial contra todos os requeridos e determinou a citação dos mesmos.
Contestação apresentada pelo réu EVERTON RIBEIRO MORETISON às fls. 239/244.
Requerimento do Estado do Espírito Santo, pugnando pela sua exclusão como litisconsorte ativo (fls. 245/246 e 247/248).
A r. decisão de fls. 280/283 determinou a remessa dos autos da presente ACP para o e. TJES, por força da Emenda Constitucional nº 85/2012, sendo impugnada por agravo de instrumento interposto pelo MPES, cuja cópia se encontra às fls. 285/335, sendo que a r. Decisão Monocrática proferida nos autos tombados sob o nº 0014346-31.2013.8.08.0024 atribuiu o almejado efeito suspensivo ao recurso e determinou a permanência da demanda neste Juízo.
Por seu turno, a r. decisão de fls. 364/370 declarou ex-officio a inconstitucionalidade da EC 85/2012 e determinou o processamento/julgamento do feito.
Contestação oferecida pelos requeridos LUCIANO SORDINE PEREIRA e MAURÍCIO ALVES DOS SANTOS FILHO às fls. 390/421.
Réplica às fls. 422/424.
Decisão saneadora proferida às fls. 426/430, oportunidade em que houvera a fixação dos pontos controvertidos e a determinação de intimação das partes para fins de indicarem motivadamente eventuais provas para a fase instrutória.
Os requeridos MAURÍCIO ALVES DOS SANTOS FILHO e LUCIANO HENRIQUE SORDINE PEREIRA pugnaram pela produção de prova testemunhal à fl. 435, bem como o réu EVERTON RIBEIRO MORETISON às fls. 442/443.
Renúncia dos patronos dos réus MAURÍCIO ALVES DOS SANTOS FILHO e LUCIANO HENRIQUE SORDINE PEREIRA à fl. 436.
O requerido LUCIANO HENRIQUE SORDINE PEREIRA constituiu novo patrono à fl. 448.
O despacho de fl. 451 designou AIJ para o dia 27/09/2016, às 13:30h, todavia, o ato processual foi redesignado para 03/11/2016 por força de impossibilidade de comparecimento do ilustre advogado dos demandados LUCIANO HENRIQUE SORDINE PEREIRA e EVERTON RIBEIRO MORETISON.
Desistência pelo MPES quanto à oitiva da testemunha JOSÉ RAIMUNDO PINHEIRO DOS SANTOS (fl. 469).
Audiência de instrução e julgamento realizada às fls. 470/471, ocasião em que foi ouvida tão somente uma testemunha, conforme se vê do termo juntado às fls. 472/473, sendo encerrada a instrução processual e determinada a abertura de vista às partes para apresentação de alegações finais.
Alegações finais do MPES às fls. 474/480.
Alegações finais dos réus MAURÍCIO ALVES DOS SANTOS FILHO e LUCIANO HENRIQUE SORDINE PEREIRA às fls. 481/488.
Vieram-me os autos conclusos para sentença.
É o relatório. DECIDO.
Não havendo qualquer questão processual pendente de apreciação, passo à análise do mérito.
A presente ação civil pública visava a condenação dos réus pela suposta prática de atos de improbidade previstos nos arts. 9º e 10, ambos da Lei nº 8.429/92. Senão vejamos o que rezam os citados dispositivos legais:
Art. 9º. Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e notadamente:
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
A subsunção de uma conduta fática presente nos referidos artigos depende da demonstração cabal dos seguintes elementos: sujeito passivo, sujeito ativo e ocorrência de ato danoso causador de enriquecimento ilícito e/ou prejuízo ao erário público. Assim, somente com a presença de tais elementos é que o agente administrativo e, eventualmente, um terceiro poderão sofrer as sanções do artigo 12 da Lei nº 8.429/92, caso contrário, não havendo a identificação de alguns deles, inviabilizada estará a condenação.
A palavra improbidade provém do latim improbitate, e significa, essencialmente, desonestidade, desrespeito, inadequação ao padrão ético e moral, e afastamento da boa conduta. Alguns autores interpretam-na como sinônimo jurídico de corrupção e desconsideração ao patrimônio público. É possível conceituar a improbidade administrativa do agente público: toda conduta ilegal (corrupta, nociva ou inepta) do agente público, dolosa ou culposa, no exercício (ainda que transitório ou sem remuneração) de função cargo, mandato ou emprego público, com ou sem participação (auxílio, favorecimento ou indução) de terceiro, que ofende os princípios constitucionais (expressos e implícitos) que regem a Administração Pública.
A improbidade administrativa, nos dizeres de Motauri Ciochetti pode ser definida como:
“Incorreção no trato da coisa pública, no descumprimento dos princípios que regem e norteiam a administração pública, implicando a ‘ideia de violação de preceitos legais e/ou morais que vinculam a atividade dos agentes públicos, violação intencional ou involuntária, dolosa ou culposa’ (apud Fábio Medina Osório). Em outras palavras, improbidade administrativa ‘é conduta denotativa de subversão das finalidades administrativas, seja pelo uso nocivo (ilegal e imoral) do Poder Público, seja pela omissão indevida de atuação funcional, seja pela inobservância dolosa ou culposa das normas legais‘ (apud Marino Pazzaglini Filho)” (in “Interesses Difusos em Espécie Direito Ambiental, Direito do Consumidor e Probidade Administrativa”, 3ª edição, Editora Saraiva, 2013, p. 136/137).
Pois bem. Após encerramento da instrução processual, verifica-se que as provas carreadas ao presente feito não se mostram suficientes à procedência do pedido autoral. Nesse passo, quanto à necessidade de prova cabal para a condenação por ato de improbidade administrativa, cita-se o seguinte precedente:
“ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDÍCIOS. 1. A ação de improbidade administrativa exige prova certa, determinada e concreta dos atos ilícitos, para ensejar condenação. Não se contenta com simples indícios, nem com a verdade formal. 2. Acórdão que reconheceu existir, apenas, indícios da prática de improbidade administrativa. Improcedência do pedido que se impõe. 3. Não cabe imposição de ônus de sucumbência ao Ministério Público, em ação de improbidade administrativa cujo pedido foi improcedente, salvo comprovada má-fé. 4. Recursos improvidos“. (STJ, REsp nº 976.555/RS, Min. José Delgado, Primeira Turma, DJe 05.05.2008).
Conforme relatado, pretende o Órgão Ministerial ver configurado o ato de improbidade administrativa consubstanciado na nomeação do requerido MARÍCIO ALVES DOS SANTOS FILHO para exercer cargo comissionado de “Agente de Gabinete de Representação Parlamentar” no gabinete do corréu LUCIANO HENRIQUE SORDINE PERERIA, então Deputado Estadual, vez que aquele primeiro não comparecia à Assembleia Legislativa por incompatibilidade de horário, tendo em vista que também cursava medicina em tempo integral no Centro Universitário do Espírito Santo – UNESC.
Por outro lado, aduziu que além do requerido MAURÍCIO ALVES DOS SANTOS FILHO não ter cumprido integralmente suas obrigações no cargo público que ocupou junto à ALES entre os exercícios de 2009 e 2010, os atestados de frequência firmados pelos requeridos LUCIANO HENRIQUE SORDINE PEREIRA e EVERTON RIBEIRO MORETISSON seriam supostamente “material e ideologicamente falsos”.
A fundamentação desta sentença deve tomar por base os pontos controvertidos fixados no saneamento do feito, quais sejam: (1) se o requerido Maurício Alves dos Santos Filho prestou serviços regularmente no cargo comissionado junto à ALES; (2) se o requerido Maurício Alves dos Santos Filho desempenhou atividades inconciliáveis com o cargo em comissão; (3) se os atestados de frequências firmados pelos requeridos LUCIANO HENRIQUE SORDINE PEREIRA e EVERTON RIBEIR MORETISSON são material e ideologicamente falsos; (4) se existente dolo ou culpa nos atos supostamente ilegais imputados aos requeridos; (5) se houve prejuízos à administração pública, inclusive extrapatrimoniais; (6) se houve enriquecimento ilícito dos agentes beneficiados pelos supostos atos de improbidade.
(1) se o requerido Maurício Alves dos Santos Filho prestou serviços regularmente no cargo comissionado junto à ALES:
Pois bem, o ponto nodal a ser verificado diz respeito à existência de contraprestação laboral do réu MAURÍCIO, visto que resta incontroverso o recebimento da remuneração correspondente no período de 25/11/2009 e 09/08/2010.
Conforme restou comprovado pelo depoimento da testemunha LEANDRO DE OLIVEIRA MOREIRA (fls. 472/473), o requerido “exercia função de apoio ao deputado Luciano em sua base eleitoral, qual seja, junto aos Municípios do Norte do estado, notadamente Colatina, Pancas, Alto Rio Novo e Mantenópolis”. A testemunha disse, ainda, que “o requerido Maurício auxiliava o trabalho parlamentar do deputado junto às Associações de Produtores Rurais, Associações de Moradores, além de atuar como interlocutor junto aos vereadores e prefeitos municipais daquela região”.
De outra banda, consta da prova colhida durante a AIJ que “era comum o réu MAURÍCIO atuar no período noturno e aos finais de semana, tendo em vista que os produtores rurais trabalhavam durante o dia, o que impossibilitava eventuais constatou reuniões na parte da manhã ou da tarde”. A testemunha narrou, também, que tinha conhecimento de que o requerido MAURICIO cursava graduação em medicina na UNESC de Colatina naquele período que trabalhou no gabinete do Deputado Luciano, porém, “o controle de atividades do servidor mantido em atuação externa era disciplinado pela já mencionada resolução, bem como o gabinete controlava através de relatórios e também através de supervisão quinzenal do próprio depoente nas localidades que o Requerido Maurício atuava”.
Desta forma, a prova oral realizada nos autos aponta no sentido de que efetivamente o requerido MAURÍCIO prestava serviços ao então Deputado Estadual LUCIANO HENRIQUE SORDINE PEREIRA, não encontrando respaldo os argumentos dispendidos na exordial e sustentados em sede de alegações finais pelo órgão ministerial.
(2) se o requerido Maurício Alves dos Santos Filho desempenhou atividades inconciliáveis com o cargo em comissão:
Neste aspecto, a prova oral é clara ao apontar que o requerido MAURÍCIO conseguia conciliar a sua vida acadêmica com as atividades exercidas por força do cargo em comissão, notadamente em razão de que, como dito alhures, as reuniões e contatos mantidos com os Munícipes, Associações e Prefeitos ocorriam no período noturno ou nos finais de semana.
Assim, conclui-se que não restaram demonstradas de forma robusta as condutas ilícitas descritas pelo Ministério Público Estadual, pois nas ações de improbidade administrativa é mister que seja provado inequivocamente a prática do ato ímprobo, por aplicação da garantia da presunção de inocência. Nessa mesma linha de pensamento a jurisprudência de nossos Tribunais:
APELAÇÃO CÍVEL – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA – REEXAME NECESSÁRIO CONHECIDO DE OFÍCIO– ALEGAÇÃO DE QUE A REQUERIDA SERIA “SERVIDORA FANTASMA” DA CÂMARA MUNICIPAL, ISTO É, QUE NÃO COMPARECIA E NÃO EXERCIA AS FUNÇÕES DO CARGO EM COMISSÃO PARA O QUAL FOI CONTRATADA, E QUE SUA CONTRATAÇÃO SE DEU APENAS PARA FAVORECER ECONOMICAMENTE OS REQUERIDOS – AUSÊNCIA DE PROVA SEGURA QUANTO AO FATO NOTICIADO NA INICIAL – MEROS INDÍCIOS QUE SE MOSTRAM INSUFICIENTES PARA UMA CONDENAÇÃO – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA NÃO CONFIGURADA – APELAÇÃO NÃO PROVIDA.SENTENÇA MANTIDA EM REMESSA OFICIAL CONHECIDA DE OFÍCIO.a)- “Estão sujeitos às sanções da Lei n.º 8.429/92 os agentes políticos que tenham praticado atos de improbidade no exercício da função administrativa. (…). Configura ato de improbidade administrativa receber vencimentos de cargo público sem o efetivo exercício. Servidor-fantasma. A condenação, contudo, exige prova inequívoca de que o servidor público não exerceu as funções do cargo para o qual foi nomeado.(…) Sem prova conclusiva da percepção pelo servidor público recebeu vencimentos sem exercer as atividades do cargo, é de ser julgada improcedente a ação de improbidade administrativa. (…)” (TJRS, Apelação Cível Nº 70039864467, Relator: Maria Isabel de Azevedo Souza, J. 31/03/2011).b)- No caso dos autos, ante a ausência de prova segura e induvidosa a embasar os fatos descritos na inicial, não há falar em configuração de ato de improbidade administrativa cometida pelos apelados, no sentido de que o primeiro apelado tenha contratado a terceira para trabalhar como “funcionária fantasma” em conluio com o segundo apelado (vereador em cujo gabinete a servidora estava lotada mas, supostamente, não trabalhava). Não havia regulamentação das funções na época, e os servidores detentores de cargos em comissão podiam trabalhar externamente. (TJPR – 5ª C.Cível – AC – 1222890-3 – Guarapuava – Rel.: Rogério Ribas – Unânime – – J. 16.12.2014)
APELAÇÃO CÍVEL – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 9º, 10 E 11 DA LEI Nº 8.429/92 – ASSESSOR JURÍDICO – FUNCIONÁRIO FANTASMA – REMUNERAÇÃO SEM CONTRAPRESTAÇÃO – INCOMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS – FATOS NÃO COMPROVADOS – AUSÊNCIA DE ATO IMPROBO – RECURSO IMPROVIDO. 1. A probidade da Administração é um valor ínsito e indispensável para qualquer regime de direito, em que se busca manter a existência da própria figura estatal, bem como a consecução de políticas públicas igualitárias, justas, eficazes, mediante a atuação administrativa impessoal e voltada à observância da estrita legalidade, nos termos do que se extrai do artigo 37, parágrafo 4º, da Constituição Federal. 2. Não há que se falar em ato de improbidade administrativa se não restou comprovado que a parte tenha se locupletado ilicitamente dos valores pertencentes ao erário municipal sem a devida realização de serviços para o cargo comissionado que fora nomeado. Ao contrário, a prova testemunhal realizada nos autos foi no sentido de demonstrar que o assessor jurídico efetivamente, apesar de também possuir vínculo com uma empresa privada, cumpriu com os seus deveres funcionais enquanto exercia o cargo comissionado na Câmara Municipal. 3. Recurso improvido.(Processo APL 0014939020088080015 Orgão Julgador QUARTA CÂMARA CÍVEL Publicação 25/04/2013 Julgamento 15 de Abril de 2013 Relator TELEMACO ANTUNES DE ABREU FILHO)
(3) se os atestados de frequências firmados pelos requeridos LUCIANO HENRIQUE SORDINE PEREIRA e EVERTON RIBEIR MORETISSON são material e ideologicamente falsos:
Ora, conforme já registrado anteriormente, não há que se falar em falsidade material ou ideológica dos atestados de frequência referentes às atividades do réu MAURÍCIO, visto que o mesmo exercia seu mister na base eleitoral do então Deputado Estadual LUCIANO HENRIQUE SORDINE PEREIRA, o que é comprovado pela prova testemunhal colhida na fase instrutória.
Ao analisar situação fática semelhante, o Egrégio Tribunal de Justiça deste Estado se manifestou no sentido de que o alegado ato de improbidade consubstanciado na nomeação de servidores “fantasmas”, até mesmo pela gravidade dos atos tipificados na Lei n. 8.429/92, não pode gravitar em meras hipóteses ou conjecturas, devendo ser cabalmente demonstrado. Senão vejamos:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CÂMARA MUNICIPAL. VEREADOR. ASSESSORES PARLAMENTARES. CARGOS COMISSIONADOS. SUPOSTO ESQUEMA DE FUNCIONALISMO FANTASMA E DE REPASSE DE PARTE DOS VENCIMENTOS AO AGENTE POLÍTICO (RACHID). SERVIÇOS EFETIVAMENTE PRESTADOS. CONTRAPRESTAÇÃO DEVIDA. CONDUTA ÍMPROBA NÃO CONFIGURADA. MATÉRIA PROBATÓRIA. ÔNUS DO AUTOR. ART. 333 DO CPC C⁄C ART. 156 DO CPP. PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1 – A aplicabilidade da Lei n.º 8.429⁄1992 deve ser analisada pelo julgador de forma atenciosa, prudente, com bom senso, considerando a severidade da lei, capaz de suspender os direitos políticos, determinar a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário (art. 37, § 4º, da CF⁄88). 2 – Assim, pela gravidade das sanções previstas na Lei de Improbidade, não se pode permanecer no campo das meras conjecturas e alegações, cabendo ao autor da demanda o ônus da prova sobre os fatos imputados aos supostos agentes ímprobos, a teor do art. 333, I, do CPC, e do art. 156 do CPP. 3 – In casu, um dos fatos geradores dos atos de improbidade reconhecidos na sentença originária foi a manutenção de servidores “fantasmas” no quadro de pessoal vinculado ao gabinete do ex-vereador apelante, os quais supostamente percebiam remuneração sem prestar qualquer serviço relacionado à função que exerciam. 4 – Como não há nos autos prova cabal de que os ex-servidores apelantes desempenhavam atividades inconciliáveis com os cargos em comissão para os quais haviam sido nomeados, deve prevalecer o princípio da presunção da inocência, por mais grave que seja a imputação. 5 – Aliás, os depoimentos colhidos durante a instrução processual foram uniformes no sentido de que todos os acusados prestavam serviços regularmente, alguns prioritariamente no âmbito interno do Gabinete, e outros exercendo, concomitantemente, atribuições externas, todas elas, pelos relatos testemunhais, voltadas à identificação de necessidades nas áreas da saúde, educacional, rural, etc., com participação em reuniões, seminários, palestras, grupos de trabalho e afins. Isso tudo sem prejuízo do trabalho interno na Câmara Municipal. 6 – Apesar do laborioso esforço para demonstrar a conduta ímproba dos apelantes, o Ministério Público não logrou êxito em comprovar a prática dos atosdefinidos nos artigos 9º, IV e XI, e 10, I e XII, da Lei n.º 8.429⁄1992, existindo, na verdade, significativos elementos probatórios em sentido contrário. 7 – Quanto à segunda prática que teria gerado os atos de improbidade discutidos na vertente ação civil pública, descrita na sentença como a “apropriação indevida de parte do salário dos Servidores pelo Vereador”, também nessa seara nada se provou contra o ex-parlamentar apelante. 8 – Diante da ausência da necessária certeza de que o ex-vereador praticou a conduta ímproba apelidada de “Rachid”, por imposição do consagrado brocardo in dubio pro reo, merece reforma a sentença hostilizada. 9 – Recurso conhecido e provido. (TJES, Classe: Apelação, 6100061057, Relator Designado: ÁLVARO MANOEL ROSINDO BOURGUIGNON, Órgão julgador: SEGUNDA CÂMARA CÍVEL, Data de Julgamento: 22/04/2014, Data da Publicação no Diário: 07/05/2014)
(4) se existente dolo ou culpa nos atos supostamente ilegais imputados aos requeridos:
Como dito, não estamos diante dos alegados atos ímprobos sustentados pelo órgão ministerial, o que afasta peremptoriamente o apontado elemento subjetivo nas condutas tidas por ilegais pelo parquet. A análise minuciosa dos autos, sobretudo no tocante à prova testemunhal, não é capaz de demonstrar, com seguridade e concretude, os indícios mínimos de dolo específico a serem extraídos das condutas imputadas aos réus, pautados na intenção de causar prejuízo ao erário, enriquecimento ilícito e na efetiva ocorrência de prejuízos aos cofres públicos.
(5) se houve prejuízos à administração pública, inclusive extrapatrimoniais:
Não restou constatado após o término da instrução processual a existência do apontado prejuízo ao erário, visto que o requerido MAURÍCIO efetivamente atuou na base eleitoral do réu LUCIANO.
De outra banda, conforme entendimento jurisprudencial do STJ, a existência de prejuízo é condição para se determinar o ressarcimento ao erário. Nesse sentido, dentre outros: Esp 1214605/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 13/06/2013; REsp 1038777/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 16/03/2011.
(6) se houve enriquecimento ilícito dos agentes beneficiados pelos supostos atos de improbidade:
Não havendo prejuízo à administração pública, também não estamos diante de enriquecimento ilícito por parte do requerido MAURÍCIO, mormente em razão da comprovada contraprestação laboral do então servidor público.
Necessária se faz a comprovação da má-fé e da desonestidade do agente público, com o fim de se distinguir a simples irregularidade da improbidade. E, no caso, os elementos constantes dos autos não demonstram que os requeridos tenham agido desonestamente com a nítida intenção causar prejuízo ao erário ou, até mesmo, de locupletar-se ilicitamente. Assim, não restando cabalmente evidenciado o dolo, a culpa ou a má-fé no atuar dos réus, não há como concluir pela configuração do ilícito de improbidade administrativa descrito nos artigos 9º e 10 da LIA.
Nesse contexto, não havendo a comprovação da ocorrência do ato necessário à configuração de atos de improbidade administrativa, impossível a condenação dos réus nas sanções do art. 12 da Lei nº 8.429/92.
Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO formulado na petição inicial e, ato reflexo, DOU POR EXTINTO O PROCESSO, com resolução do mérito, na forma do art. 487, I, do CPC. Sem condenação em custas e honorários advocatícios.
NOTIFIQUE-SE O MPES e INTIMEM-SE OS RÉUS.
Após o trânsito em julgado, ARQUIVEM-SE OS AUTOS. Diligencie-se.
Fonte: voz da barra |